terça-feira, 29 de novembro de 2011

Medidores de Felicidade

     
       Existem algumas pessoas que parecem que nasceram para medir a felicidade alheia e ao constatarem um nível alto elas simplesmente precisam baixá-la. São pessoas que não conseguem conviver com a felicidade alheia, pessoas invejosas que vão para cima ao porem os outros para baixo.
       Não devemos nos deixar levar pelas tentativas odiosas desse tipo de gente de fazer-nos ser tão infelizes quanto elas, não podemos nos por pra baixo pela simples incapacidade de um outro alguém de aceitar nossa felicidade.
        Façamos o que nos agrada - independente do que nos digam. Não liguemos para olhares tortos e palavras ofensivas, sejamos mais felizes por nós mesmos.
         Seja você mesmo; 
                             Ignore;
                                   Seja Feliz

A Metáfora X-Men

         Eu sempre adorei quadrinhos e afins, mas o meu favorito sem dúvida sempre foi X-Men, a série toda é mostrada de uma forma inteligente e sagaz e um dos fatores que mais me agradam nela sãos as metáforas empregadas.
          Para quem não conhece a história dos X-Men basicamente é: eles são frutos de uma mutação genética humana causada por um natural processo evolutivo, isso faz com que eles sejam hostilizados e discriminados, na série há o grupo X-Men que procuraria uma concomitância amistosa entre humanos e mutantes e o grupo do antagonista Magneto que proporia o extermínio dos humanos.
          A série metaforiza minorias e descriminados sejam eles por meio da homofobia, do racismo e até do preconceito religioso; a adaptação para o cinema manteve essa intenção crítica que a série apresenta.
           Uma metáfora bem clara em relação a comunidade LGBT é vista na idade - puberdade - em que os poderes se "apresentam" - Isso tem uma bastante visível relação com a idade em que os jovens em geral percebem sua sexualidade - seja ela homo ou heterossexual. Outra metáfora se mostra visível numa cena do filme onde a personagem senador Robert Kelly se mostra contra os mutantes lecionarem em escolas, que é uma questão até hoje levantada em relação a homossexuais. Há também a cena em que o pai da personagem Warren Worthington III (Anjo) tenta curar sua mutação num procedimento que nos remete à décadas atrás onde tentavam curar a homossexualidade com remédios e cirurgias inseguras, onde muitos morriam e outros ficavam com sequelas e traumas irremediáveis. A cena que talvez seja mais claramente associada com a homossexualidade é talvez a cena em que o personagem Bobby Drake (Homem de Gelo) conta aos pais que é mutante recebendo a rejeição destes.
            Na série há também a questão do preconceito contra judeus representado pelo mutante magneto um judeu que foi prisioneiro de um campo de concentração quando criança, este por vezes faz referência a sua prisão como quando questionado sobre sua "marca" onde responde que "já fora marcado antes, e nenhuma agulha tocaria sua pele novamente" mostrando então a tatuagem numérica com a qual os nazistas marcavam seus prisioneiros.
             A personagem Charles Xavier (Professor X) por vezes é associada ao militante Matin Luther King, essa associação se dá ao fato de muitos se referirem as tentativas do professor de conciliar mutantes com humanos de "o sonho de Xavier", enquanto uma das frases mais conhecidos de King seja "Eu tive um Sonho".
              Portanto a série X-Men embora antiga pode muito bem ser associada as constantes lutas das minorias nos dias de hoje, é um prato cheio não só de entretenimento, mas também de cidadania e humanismo pra todos aqueles que a lerem de forma menos superficial.



Pense, Acredite e Viva!

Todos nós temos momentos de fraqueza, se isso nunca te aconteceu pode ter certeza que ira acontecer.

E quem consegue ser feliz sempre? Ninguém.

Existem aqueles dias em que não importa o lugar, nem a hora e independentemente de quem estiver por perto, de quem tente fazê-lo sorrir, você não sorrirá e só o que conseguirá fazer é enxugar as lágrimas que insistirão em cair, por mais que você
tente controlá-las.

Pobre daquele que pensa que tudo na vida é alegria, esse talvez seja o que mais sofrerá, por não estar pronto e nem acostumado a enfrentar o mundo e as pessoas como realmente são.

Chore sempre que necessário, mas nunca pense em desistir, pois amanhã pode ter certeza, sorrirás.

Fortaleça a vontade de vencer, pois esse será um grande dom.

Pense, Acredite e Viva!

It's time. - Já é Tempo


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segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Empatia


Empatia: O estado de empatia, ou de entendimento empático, consiste em perceber corretamente o marco de referência interno do outro com os significados e componentes emocionais que contém, como se fosse a outra pessoa, em outras palavras, colocar-se no lugar do outro, porém sem perder nunca essa condição de “como se”. A empatia implica, por exemplo, sentir a dor ou o prazer do outro como ele o sente e perceber suas causas como ele a percebe, porém sem perder nunca de vista que se trata da dor ou do prazer do outro. Se esta condição de “como se” está presente, nos encontramos diante de um caso de identificação. 

          A empatia é um dos sentimentos mais incríveis e bonitos que existem, você pode sentir empatia por qualquer um  seja conhecido ou não, seja agradável ou não.
          A empatia torna melhor a convivência em sociedade, ela nos mostra o jeito correto de agir para com as outras pessoas, algumas pessoas tem mais facilidade em se por no lugar das outras, mas essa é uma característica que deve ser trabalhada, quando nos mostramos empatas para com os outros nos tornamos pessoas melhores, pessoas mais respeitadoras, mais respeitáveis. 
          Se todas as pessoas cultivassem essa característica, se todas as pessoas se pusessem no lugar umas das outras com mais frequência muitos problemas deixariam de existir, bullying, preconceito, discriminação... Pense, como aquela pessoa que você ofendeu se sentiu, pense no que aquela pessoa que você tento recrimina sente, torne-se mais empata.
           Seja uma pessoa melhor. Seja uma pessoa mais madura!

Sonhos


Todos nós temos um sonho. Seja ele possivelmente fácil de conseguir ou totalmente complicado, mas temos. É ele que muitas vezes nos faz seguir em frente, são eles que nos dão forças nos momentos difíceis.

Quando se sonha, se vive, não apenas por viver, mas a espera de algo que supostamente fará sentirmo-nos felizes, realizados.

Eles instigam, emocionam, levantam-nos e nos completam. Pobres são aqueles que não sonham, vivem divididos entre o medo e a subestimação, acreditando que tudo que se deseja é inconquistável, não possuem a coragem de arriscar-se por algo incerto.

Sonhos se realizarão quando você lutar por eles, quando você acreditar que pode conquista-los e não deixar nada tirar o foco de seu objetivo.

Sonhe,

Lute,

Realize !

Mude



Mude mudar é sempre bom. Cresça, não pelos outros, mas por você mesmo.

Lute, continue, acredite, não se renda facilmente aos obstáculos impostos pela sociedade, quando você quer e acredita verdadeiramente, seus sonhos se tornam realidade.

Não abaixe a cabeça em uma derrota, saiba ser humilde e se desculpar nas horas certas. Saiba agradecer a todos aqueles que te ajudaram a chegar onde você está agora.

E nunca... Nunca deixe que os pensamentos ou as palavras de pessoas que te julgam sem te conhecer te prejudiquem, o que realmente importa é a sua opinião.

O Segredo de Bia

     
         Sentada numa mesinha ao lado de uma padaria, Bia com um copo de café na mão encarava o vazio, o sol se punha e ele logo chegaria... Teria de falar algo, mas não sabia como... Cometera um erro e agora já não sabia o que pensar nem como agir.
         Ao mesmo tempo lembrava da noite passada, a fatídica noite passada, porque tinha que ter ouvido Gabriel? Gabriel e suas ideias... Quando o telefone tocara e vira seu nome devia ter desligado, mas não, ignorar o melhor amigo de infância seria um coisa terrível. Atendera.
         Gabriel a convidava para que fossem à cidade passear juntos como sempre faziam antes, "Se fosse esperta teria fugido dele", pensou Bia, sabia que estava noiva agora, mas... Eram amigos e não se viam a tanto tempo, devia dar uma chance a ele. Foi. A principio a coisa correu bem, comeram, riram, conversaram, compraram, passaram numa biblioteca. Então Gabriel resolveu que queria ir num maldito bar! Estava tudo claríssimo para Bia, mas porque desconfiar de Gabriel, tinha se comportado tão bem até ali, nada das "coisas antigas"...
         Foram. Na meia luz do bar beberam, brincaram, nada demais, Bia já estava meio tonta, nunca fora de beber, desde a adolescência quando Gabriel cismava de beber "um pouquinho"... Mas agora era uma mulher, estava noiva, devia ser capaz de encarar um noitada sóbria! Doce ilusão... Não tardou a estar dançando na mesa de algum desconhecido
         Gabriel a pôs sentada em algum banco perto do bar, embora tenha proibido o atende a lhe dar mais um copo. "Você ainda não sabe berber!" - Riu-se dela, "Aprenderei um dia" Replicou Bia com a voz pastosa, "Com quem? Seu noivo sem graça? até onde eu sei ele não bebe, se Ana soubesse com quem você vai se casar..." Típico! Gabriel ressuscitando o antigo trio perfeito, eramos nós três, Gabriel, Ana e eu, sempre juntos correndo pelas ruas da cidade, crescemos juntos, mas cada um seguiu um caminho, Ana viajara pata Londres seguira seu sonho, Gabriel também seguira o seu tornando-se lutador, já Bia... bem tornara-se bibliotecária da mesma cidade onde cresceu, gostava de ler então não era um completo desperdício - pelo menos era assim que preferia encarar as coisas.
        - Olhe Gabriel, eu vou me casar com Renato sim, ele é um homem muito bom pra mim e Ana irá aceitar isso, já mandei o convite pelo correio, será uma surpresa, ela vai ficar feliz por mim, diferente de você! - Bia falara com uma firmeza surpreendente.
        - Aposto que sim, surpresa agradável... Por isso você preferiu não contar por telefone? Ou foi só pra não ter que escutar o que ela tinha a dizer?
         - Não me venha com que essa agora Gabriel, você não entende nada! E vocês não podem deixar uma rixa de infância arruinar a minha felicidade! - Era mentira, Gabriel obviamente entendera muito mais do que Bia era capaz de admitir...
         - É claro... Porque você está feliz agora, não está?
         Bia trincou os dentes e não respondeu, então Gabriel levantou-se beijou-lhe o rosto e perguntou:
         - Está mais feliz agora do que quando eramos eu e você planejando o nosso casamento?
          Foi-se, deixando Bia na mesa num estado estranhamente sóbrio para quem ainda a pouco estava a dançar sobre as mesas.
           E agora Bia estava lá parada tomando café, esperando e pensando no que dizer para seu amável, mais não amado noivo.

(Carlos W.)

domingo, 27 de novembro de 2011

Desabafo



A cada dia que passa, é mais difícil suportar essa dor toda essa repressão sem razão.

Distrair-me? Não consigo, pois tudo que faço leva á isto, a vida têm sido tão amarga.

De que adianta desejos, vontades e sonhos e, não poder conquista-los. Do que adianta ter assas e não poder voar.

Sou tomada por uma súbita vontade de acabar com isso, seria prazeroso, ou melhor, libertador um fim. Onde irei chegar com esse desespero que atinge minha alma? Não sei, por enquanto tento apenas continuar viva.

Quem me sufoca? Quem me mantém acorrentada?

Aqueles que dizem me amar, e desejar minha felicidade.

Estou cansada de toda essa hipocrisia! Não acredito na felicidade no modo como vivo. Não acredito nas pessoas, muito menos no que dizem e impõem.

Sofri, sofro, e sofrerei em quanto não me libertar, em quanto não expor meus sonhos e opiniões.

Não escolhemos onde nascemos, mas podemos mudar os medíocres pensamentos de uma sociedade hipócrita e preconceituosa que são colocados em nossas mentes quando criança.

Sei que preciso crescer, e muito, mas também sei que posso encarar esse mundo. Sei o suficiente para afirmar que o caminho para o qual me empurram não me faz feliz. Jamais me trouxe algo de bom.

Pensem o que quiser, falem o que bem entenderem. Não me importo, não mais, aprendi da pior maneira que o que realmente importa é ser feliz... Ser feliz do seu modo e não do modo como é imposto pela família ou pela sociedade.

Cansei de ser reprimida, criticada e julgada, simplesmente não suporto isso explodindo em minha mente.

Surpreende-me a maneira como os que dizem “querer seu bem” impõem suas regras, crenças e seu modo de pensar (se é que pensam), aos outros sem ao menos saber se, para eles (á quem dizem amar) é bom, faz feliz, acreditam. E me obrigam a ficar calada.

E o que resta? Dentro de mim fica marcado o ódio a revolta e as mágoas.


Moralismo Emprestado

     
          Uma das coisas que mais me revoltam são pessoas que aderem pensamentos, ditados, filosofias e morais sem uma mínima reflexão a respeito, são pessoas vazias e sem conteúdo que seguem a massa de olhos vendados ao mundo ao seu redor.     
         Existem certas pessoas que parecem ser muito moralistas, que realmente dão a impressão de terem refletido sobre assuntos e ter chegado a decisões próprias, mas aí a ilusão se quebra e você percebe que ela não passa de uma falsa moralista que ainda por cima pega suas morais emprestadas de um senso comum.
        Pessoas com moralismo emprestado são aquelas que geralmente mantém um horda de conceitos morais, sem qualquer pensamento a respeito, geralmente são aqueles que pensam que "não se pode querer tudo", "deve sempre manter a paz" e "não se discute religião e política"(embora curiosamente discuta futebol), e outros tantos ditados populares - não que estes estejam necessariamente errados -  mas que simplesmente perdem completamente o valor quando partem de repetidores acéfalos, mas essa pessoas não seguem apenas o lado "arco-íris" da massa, essas mesmas pessoas são as mais propicias a terem preconceitos e serem discriminadoras, simplesmente porque não refletem e acabam poe seguir e acreditar em qualquer coisa que lhes é passada.
     
           

Viver ou apenas, existir.


Há quem diga que viver e existir, são as mesmas coisas, porém não são.

Viver não é apenas existir, mas sim saber aproveitar a vida e o que ela tem a oferecer. Muitas pessoas vivem uma vida inteira e só se dão conta do tempo que perderam e do que deixaram de aproveitar quando se deparam com a morte.

Devemos enxergar em cada dia uma nova oportunidade para lutar... Lutar por nossos sonhos, correr atrás do que acreditamos fazer com que cada dia seja único e inesquecível. Sejam por grandes coisas ou apenas pequenos momentos, pequenos, porém marcantes.

Viva intensamente faça aquilo que tem vontade, não deixe que as oportunidades passem diante de você sem aproveitá-las ao máximo, nunca deixe nada pra depois, porque depois pode ser tarde demais.

Ame, desperte no seu mundo, no seu jeito de ser, não faça tudo certinho, porque sempre tem que fazer algo errado, não viva abaixo de regras, mas crie suas próprias regras, seu próprio mundo, e seja feliz. Viver ou apenas existir, resta a você escolher seu caminho.


“A verdadeira função do homem é viver,

não apenas existir.”

Jack London

sábado, 26 de novembro de 2011

O Que é Felicidade?

       
         Uma das coisas que o ser humano mais sente prazer em fazer é reclamar, do tempo, da roupa, da comida, do amor, do mundo, da casa, da escola, do carro. e assim vai... Reclamando e reclamando, mas afinal o que vem a ser felicidade?
         Muita gente põe as esperanças em que a felicidade venha com o dinheiro, compras e luxuosidade, mas ainda assim tantas outras defendem veementemente que dinheiro não traz felicidade.
          Há aqueles que acreditem que a felicidade aparecerá junto com o amor da sua vida, assim que encontrar o amor ganhará felicidade eterna.
          Para uns a felicidade simplesmente virá no próximo carnaval, para outros a felicidade chegará no natal, no ano novo, na páscoa...
           Mas não há um consenso sobre o que é felicidade, muito menos sobre o que é ser feliz, e é por isso que a felicidade é você quem faz, se você acreditar lá estará, ser feliz pode ser riqueza, pode ser amor, pode ser carnaval... Isso só você pode decidir, o que te faz feliz? Onde está a sua felicidade?
           Sonhe. 
                  Realize. 
                            Seja feliz.

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Nostalgia de Fim de Ano...

   
         Existem umas sensações estranhas que só o final de ano consegue proporcionar, é uma mistura de ansiedade, com entusiasmo, com receio e nostalgia.
         É estranho pensar que a cada ano pessoas vão e vêm na sua vida sem que você possa fazer alguma coisa, o final de ano trás essa sensação do peso do tempo sobre nós, da nossa impotência mediante as situações da vida que vêm e vão, da nossa incapacidade em prever as mudanças, de realizá-las e ainda de aceitá-las.
         Final de ano, com aquele clima "então vem o natal e ano novo também", faz a gente sentir que algo mudou, algo se foi, algo que não vai voltar, oportunidades passaram, sonhos não se realizaram, pessoas não estarão mais presentes -  nunca mais.
        Mas ao mesmo tempo faz sentir a excitação de que algo vêm pela frente, novas pessoas, novas oportunidades de evolução, de realizar um novo sonho, de ser mais feliz.
        E aí você precisa decidir se vai se lamentar pelo que se foi, ou se vai aproveitar o agora se preparando para o futuro, o problema é que nem sempre essa decisão é tão fácil quanto parece.


quinta-feira, 24 de novembro de 2011

O Homem Nú


Ao acordar, disse para a mulher:
-- Escuta, minha filha: hoje é dia de pagar a prestação da
televisão, vem aí o sujeito com a conta, na certa. Mas acontece que ontem eu não trouxe dinheiro da cidade, estou a nenhum.
-- Explique isso ao homem -- ponderou a mulher.
-- Não gosto dessas coisas. Dá um ar de vigarice, gosto de cumprir rigorosamente as minhas obrigações. Escuta: quando ele vier a gente fica quieto aqui dentro, não faz barulho, para ele pensar que não tem ninguém. Deixa ele bater até cansar -- amanhã eu pago.
Pouco depois, tendo despido o pijama, dirigiu-se ao banheiro
para tomar um banho, mas a mulher já se trancara lá dentro. Enquanto esperava, resolveu fazer um café. Pôs a água a ferver e abriu a porta de serviço para apanhar o pão. Como estivesse completamente nu, olhou com cautela para um lado e para outro antes de arriscar-se a dar dois passos até o embrulhinho deixado pelo padeiro sobre o mármore do parapeito. Ainda era muito cedo, não poderia aparecer ninguém. Mal seus dedos, porém, tocavam o pão, a porta atrás de si fechou-se com estrondo, impulsionada pelo vento.
Aterrorizado, precipitou-se até a campainha e, depois de
tocá-la, ficou à espera, olhando ansiosamente ao redor. Ouviu lá dentro o ruído da água do chuveiro interromper-se de súbito, mas ninguém veio abrir. Na certa a mulher pensava que já era o sujeito da televisão.
Bateu com o nó dos dedos:
-- Maria! Abre aí, Maria. Sou eu -- chamou, em voz baixa.
Quanto mais batia, mais silêncio fazia lá dentro.
Enquanto isso, ouvia lá embaixo a porta do elevador fechar-se, viu o ponteiro subir lentamente os andares... Desta vez, era o homem da televisão!
Não era. Refugiado no lanço da escada entre os andares, esperou que o elevador passasse, e voltou para a porta de seu apartamento, sempre a segurar nas mãos nervosas o embrulho de pão:
-- Maria, por favor! Sou eu!
Desta vez não teve tempo de insistir: ouviu passos na escada, lentos, regulares, vindos lá de baixo... Tomado de pânico, olhou ao redor, fazendo uma pirueta, e assim despido, embrulho na mão, parecia executar um ballet grotesco e mal ensaiado. Os passos na escada se aproximavam, e ele sem onde se esconder. Correu para o elevador, apertou o botão. Foi o tempo de abrir a porta e entrar, e a empregada passava, vagarosa, encetando a subida de mais um lanço de escada. Ele respirou aliviado, enxugando o suor da testa com o embrulho do pão.
Mas eis que a porta interna do elevador se fecha e ele
começa a descer.
-- Ah, isso é que não!
-- fez o homem nu,sobressaltado.
E agora? Alguém lá embaixo abriria a porta do elevador e
daria com ele ali, em pêlo, podia mesmo ser algum vizinho conhecido... Percebeu, desorientado, que estava sendo levado cada vez para mais longe de seu apartamento, começava a viver um verdadeiro pesadelo de Kafka, instaurava-se naquele momento o mais
autêntico e desvairado Regime do Terror!
-- Isso é que não
-- repetiu, furioso.
Agarrou-se à porta do elevador e abriu-a com força entre os andares, obrigando-o a parar. Respirou fundo, fechando os olhos, para ter a momentânea ilusão de que sonhava. Depois experimentou apertar o botão do seu andar. Lá embaixo continuavam a chamar o elevador. Antes de mais nada: "Emergência: parar". Muito bem. E agora? Iria subir ou descer? Com cautela desligou a parada de emergência, largou a porta, enquanto insistia em fazer o
elevador subir. O elevador subiu.
-- Maria! Abre esta porta! -- gritava, desta vez esmurrando a porta, já sem nenhuma cautela. Ouviu que outra porta se abria
atrás de si.
Voltou-se, acuado, apoiando o traseiro no batente e tentando
inutilmente cobrir-se com o embrulho de pão. Era a velha do
apartamento vizinho:
-- Bom dia, minha senhora -- disse ele, confuso. -- Imagine
que eu...
A velha, estarrecida, atirou os braços para cima, soltou um
grito:
-- Valha-me Deus! O padeiro está nu!
E correu ao telefone para chamar a radiopatrulha:
-- Tem um homem pelado aqui na porta!
Outros vizinhos, ouvindo a gritaria, vieram ver o que se
passava:
-- É um tarado!
-- Olha, que horror!
-- Não olha não! Já pra dentro, minha filha!
Maria, a esposa do infeliz, abriu finalmente a porta para
ver o que era. Ele entrou como um foguete e vestiu-se precipitadamente, sem nem se lembrar do banho. Poucos minutos depois,
restabelecida a calma lá fora, bateram na porta.
-- Deve ser a polícia -- disse ele, ainda ofegante, indo
abrir.
Não era: era o cobrador da televisão. 

(Fernando Sabino)

Falta de Interesse Político

        Hoje em dia vê-se montes de jovens enchendo-se de orgulho ao afirmarem "não gostar de política", essa é decididamente um situação absolutamente lastimável, enquanto isso acontece pessoas sem nenhuma noção de política assumem o poder!
        O número de famosos sem nenhum conhecimento a respeito de política, sociologia ou filosofia - e aqui nem me refiro ao Tiririca... - assumindo cargos no congresso é alarmante! Esses eleitos ficam em seus cargos e não tem a decência de realizarem um único maldito projeto que seja útil para a população, vide os projetos do vereador Agnaldo Timóteo que está ganhando um salário gigantesco para mudar nome de rua (Lê-se: NÃO FAZER NADA!) enquanto a população não tem nem casa decente!
         Isso quando não resolvem eleger pastores (!) que além de não ajudar em absolutamente nada! ainda burlam a constituição brasileira com projetos absurdos e anti-laicos!
         Enquanto essa situação perdurar, enquanto o povo não souber votar não adianta reclamar de situações como corrupção; se nós não soubermos votar, os políticos não saberão governar.

"O maior castigo para aqueles que não se interessam por política, é que serão governados pelos que se interessam." (Arnold Toynbee)

Jovens de 68

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Feminista? Tem certeza?


     
         As mulheres tem tantos direitos quanto os homens, mas... "Não podem pegar  vários meninos numa festa, os meninos sim podem pegar várias", "É feio ver uma menina cheia de tatuagens, menino é normal", "Uma menina não pode ficar bêbada, isso é normal para meninos!", "não é normal meninas falarem sobre sexo, é uma falta de vergonha, esse tipo de conversa é coisa de homem", "Mulheres fumando perdem a feminilidade", "os meninos é que têm 'chegar' numa menina"...
        Esses e outros tantos discursos eu já ouvi de pessoas, e o pior tudo, de pessoas do sexo feminino, sim, meninas e mulheres, que mesmo tendo na ponta da língua termos como direitos iguais e feminismo continuam a ter pensamentos claramente machistas sem nem se dar conta disso!
        As pessoas de hoje em dia se recusam a pensar em de onde vêm suas verdades e o que realmente significa certos conceitos, mesmo a respeito deles mesmos!
         Vale para todos nós repensarmos sobre isso, tantas mulheres dedicaram suas vidas para que hoje outras mulheres tivessem o direito mínimo ao voto, direito mínimo à cidadania para que nós nos acomodássemos em meio a um falso igualitarismo.
        

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Quem Diria?

            "Não é que eu não goste mais de você, eu gosto de você, é só uma questão de lógica. Se um dia isso tudo vai acabar, não é melhor acabar logo agora?
            Já que vai terminar dando errado mesmo, pra que esperar? 
            É claro que um dia vai dar errado.
            A maior parte dos casais dá errado um dia.
            Por que haveria de dar certo justo com a gente?
            Melhor ficar por aqui enquanto não deu errado ainda.
            Pelo menos agora a gente ainda tem chance de ser feliz por aí.
            A gente é feliz, eu sei.
            Então, pra que estragar?
            É claro que o amor vai se gastar.
            É lógico que um dia isso vai passar.
            É óbvio que a gente não vai ser feliz assim a vida inteira.
            Não vai ser muito mais triste depois, quando a tristeza pegar a gente desprevenido?
            Um dia eu vou me sentir infeliz com você, você vai pensar em outra pessoa, eu vou pensar que me sinto infeliz com você porque você pensa em outra pessoa, você vai pensar que pensa em outra pessoa porque eu me sinto infeliz com você, ou vice-versa.
            Aí a gente vai brigar, vai se acusar, vai se culpar, vai ver que é melhor acabar, mas já vai estar muito mais acostumado um com o outro e vai ser ainda mais difícil.
            Então a gente vai tentar mas uma vez.
            A gente vai tentar mais uma não sei quantas vezes.
            Vai ter hora que sou eu que vou pedir, vamos tentar?
            Vai ter hora que quem vai pedir é você.
            A gente vai alternar os papéis de vez em quando, um indiferente e um apaixonado, uma vitima e um culpado, um coitado e um tirano, a gente vai terminar se odiando.
            Vamos deixar assim como está, eu gostando de você e você gostando de mim?
            É difícil, eu sei.
            Mas difícil mesmo vai ser um dia a gente se olhar e pensar, passou.
            Vai ser muito mais difícil ver o amor diminuindo, diminuindo, acabando, ver o tempo que era bom ficando cada vez mais distante, a gente se lembrando de agora e pensando, 'tá vendo?, era melhor ter acabado antes'.
           "Eu sei que é difícil. Mas eu acho melhor a gente acabar, Fulano."
            E só quando Fulano desistiu de argumentar e foi saindo, triste, muito triste, ela gritou, "primeiro de Abril!"
            Primeiro ele riu. Então, parou. E, antes de voltar, raciocinou um pouquinho.
            Era uma questão de lógica. Se um dia aquilo tudo ia acabar, não era melhor acabar ali? Já que ia dar errado mesmo, pra que esperar? Pensou que ia ser muito triste olhar pra ela um dia e pensar, passou. Pensou, ainda, que a tristeza tem essa mania de pegar a gente desprevenido. Mas a tristeza já estava tão longe dali, naquela hora, que nem metia mais tanto medo.
            Então ele pensou, azar.
            Aí, voltou.
            E os dois morreram de rir.
            E se beijaram.
            E morreram de rir.
            E se beijaram.
            Vai ver eles pegaram a tristeza desprevenida naquele primeiro de Abril, não sei, não posso afirmar, mas eu acho que ela se foi embora de susto. Só sei dizer que não voltou nunca mais e eles foram felizes para sempre. Quem diria?
                        Adriana Falcão

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Meu Homem

          Fico admirada ao ver como algumas mulheres reclamam dos seus homens. Querem subjugá-los e que venham rastejando aos seus pés pedindo amor. Que tenham olhos só para elas e lhes prestem contas de todos os seus passos. Ao sinal de qualquer indisposição neles, se irritam, se fecham e nos importunam.
           Eu não. Alegro-me quando o meu volta, mesmo que tarde; e agradeço a Deus que tenha voltado.
           É com a maior disposição que me levanto para preparar-lhe a comida. Enquanto esquenta a gordura, lavo meu rosto e passo um batom leve para não aparecer de cara limpa e sonolenta. Abro uma cerveja e tomamos juntos. Como ele é romântico e me faz agrados! Sabe que eu gosto de lhe fazer companhia na janta e por mais que beba na rua com os amigos, deixa sempre um espaço para tomar mais uma comigo. E fala todo dengoso "Ponha mais para você, fiinha, que eu já bebi muito."
           Quando vez ou outra ele chega bem de madrugada e diz que já comeu para não me importunar, eu fico só um pouquinho chateada, incômodo. Às vezes, coitado, chega de mansinho, pé ante pé, com receio de me despertar. Mas o meu sono é leve e eu grito do quarto "Se preocupa não, bem, que estou acordada."
           Imagine se eu vou querer como a vizinha, que ele fique preso na minha saia e me fale pra todo canto que vá. Fale se quiser porque eu nunca questionei. A hora que chegar, chegou, porque a casa é dele. Às vezes, quando ele chega cedo, pergunto se ainda vai sair, não questionando ou recriminando, mas para ver se é preciso passar uma camisa ou lustrar um sapato, porque não vou deixar meu homem sair de qualquer jeito por aí, sujeito a um amigo insinuar ou pensar que a sua mulher é uma vadia que não cuida de suas roupas. É o único reclamo meu. "Passe aqui e ponha outra muda de roupa para não sair com cheiro de suor do dia."
          Nunca o procuro. Deixo-o à vontade. Quando ele quiser, estou disposta e cheirosa, toda dele. E ele sabe muito bem.
          Outro dia uma dona me veio falar que viu meu homem num bar junto com umas vadias. Fiquei brava. Falei-lhe uns desaforos e a pus pra fora. Disse-lhe que ela era muito enxerida, e que tinha graça! Além de infernizar a vida do seu marido, que eu sei muito bem que inferniza, ainda vir envenenar a minha mente com ideias de gente doida!
          Acordei, ele do meu lado dormia sorrindo, parecendo que lia meu sonho. Dei-lhe um safanão. "É assim que você queria que eu fosse, não é, seu desavergonhado? Uma Amélia ou então me encanasse vendo os textos da Adélia Prado e ficasse toda contente e pronta a receber suas ordens. Já foi o tempo, meu caro. Agora um dia eu faço a janta, no outro você. Se quiser sair para se divertir, um dia eu olho os filhos, no outro, você. Os direitos são iguais e se não quiser assim rua." Ele olhou-me sonolento e assustado e eu falei firme " É isto mesmo!" e me virei para o lado querendo dormir e desejando que viesse um sonho diferente.

Laé de Souza.

A paz de Julia.


           
             Julia e Ricardo caminhavam de mãos dadas pelas calçadas largas, rindo e brincando, Julia então viu o a estação de trem, onde tudo havia começado, sorriu.
             Julia com seus cabelos curtos e pretos era o tipo de garota que não ficava calada, estava presente em todas as manifestações que se pode imaginar, lutava pelos direitos dos animais, pelos direitos da mulher, pelos direito dos LGBT, lutava contra a corrupção, mantinha um razoavelmente conhecido blog na internet, já tinha dado três ou quatro entrevistas na televisão isso sem contar as inúmeras vezes que fora enquadrada pelas lentes no meio de uma muvuca de ativistas, mas fora no trem lotado voltando do curso que ela o viu.
            Parado num banco cabeceando de sono nas janelas do trem estava Ricardo, ela não o conhecia, provavelmente pegavam trem todo dia juntos, mas ela não o havia notado até ali, era um homem alto de cabelos muito curtos e pretos, talvez fosse magro de mais, mas tinha algo que lhe chamara atenção, não sabia o que nem porque.
           Ela o observou ainda todo dia por dias antes de como boa feminista tomar a iniciativa, contudo engasgou na hora de puxar assunto e acabou que lhe enfiara um folheto nas mãos, e começara a tagarelar um discurso sobre empresas de cosméticos que testavam em animais; para sua surpresa ele não só as conhecia como se recusava a comprar qualquer coisa proveniente destas.
          Dali a frente foi um passo e já estavam conhecendo os pais um do outro, ele não era um ativista, vivia seu cotidiano sem grandes agitações e era por isso que ela o amava, pela paz que ele propiciava, ela não abandonou sua vida, mas agora tinha alguém para cuidar dela quando voltava para casa depois de tomar uns bons cacetetes pelo corpo numa paciata pacifista.
                 
Carlos W.

domingo, 20 de novembro de 2011

Solidão.

         
            Certas vezes a solidão me faz mais quem bem, ter um tempo onde eu não preciso olhar ao redor e fingir que eu me importo com o momento, fingir que ouvi toda a falação sem sentido ao meu redor; poder olhar pra dentro de mim mesmo e ver o que se passa na minha mente, poder olhar para trás e ver o me marcou, o que significou e qual a influência no futuro, refletir sobre aquilo que eu realmente prestei atenção, que realmente importou pra mim. A solidão pra mim é usufruir da companhia da pessoa com a qual melhor me dou: Eu mesmo.

sábado, 19 de novembro de 2011

Entrada Proibida - Adriana Falcão

A sala do coração tem muitas janelas e duas portas, a que dá pra dentro e a que dá pra fora. A que dá pra dentro está sempre aberta. A que dá pra fora vive trancada.

Espalhadas pela sala, as notícias do jornal de hoje, a bobagem dita ontem, o Natal passado, o retrasado, amula-sem-cabeça, o Banco Imobiliário, uma febre, um sarampo, a enchente, o cometa Harley, um São João, um jeep amarelo, a foto do casamento, o nascimento do filho, o velório da avó, a festa do tetra, a desesperança do mundo, a expectativa do próximo fim de semana e outras tralhas, cada qual lá, com sua importância, acumulando poeira. Talvez se sintam meio tristes por estarem virando memória, quadro, objeto na estante. Talvez se sintam felizes. Quem sabe?

O coração tem muitos quartos. No primeiro, logo o da frente, algumas lembranças dormem, umas riem, umas mentem, outras doem. O bolo de aniversário dos seus oito anos, não dos sete nem o dos nove, o olhar azul da avó quando entrava na ambulância, o primeiro beijo (foi na escada?), a primeira mão que desceu mais um pouquinho, o refrão daquela música que um dia embalou o final do seu namoro e nunca, nunca mais vai tocar no rádio, a primeira que sem ninguém explicar, você juntou o nome à pessoa, e a palavra orgasmo (tirada de alguma matéria de revista) legendou seu pensamento, uma cama laqueada com um estrado tão atento que, no melhor da história, por piada ou por recato, quase sempre desabava, aquele sapatinho de bebê que só você sabe a cor exata e o exatopompom, do dia da derrota do seu candidato, da sua ingenuidade, da sua felicidade, da sua ignorância, da importância daquela pessoa, daquela outra, e daquela, especialmente, que um dia já foi tanto, tanto, tanto.

O segundo quarto é meio escuro e faz tempo que não recebe um vento. É ali que estão guardados, em caixas, caixinhas, caixonas, envelopes, sacolas, pelos cantos, uns entulhos e uns tesouros. Quase ninguém entrou nesse quarto, além de você, e mesmo você só entra lá muito de vez em quando. Imagine só que perigo deparar-se, assim de repente, com aquela canção de ninar, um lápis de bandeirinhas mordido na ponta, o apontador verde, o estojo, a máquina de escrever do escritório do seu pai, uma barraca colorida de praia, o botão número três do elevador de um prédio antigo, o nome que você fazia com letras de macarrão ou o formato exato da boca do dono desse nome, a primeira desilusão, o primeiro desapego, a primeira devassa, uma tarde, numa praia, uma certeza insistente, a vontade de que chegue amanhã, vai amanhã, chega logo, amanhã vai ser uma beleza.

O terceiro quarto permanece fechado de dia e só se abre certas noites, em alguns sonhos. Lá estão, entre outras tantas, coisas que não fazem nenhum sentido aparente, pedaços, cheiros, fitas, mofo, uma bacia de lata, um compacto simples, um cinzeiro laranja, uma mentira, uma vergonha, um medo, um choro engolido, detalhes que nem você sabia que existiam ainda, violentos assim, se é que eles ainda existem (o coração às vezes também inventa um pouco).

O último quarto, no fim do corredor, hoje em dia é só depósito. Um dragão imenso, parado na porta, tenta parecer assustador, uma vez que serve de vigia. Ou pensa que serve. Mal sabe ele que foi tirado da fachada de um restaurante chinês, ou, na melhor das hipóteses, de uma página de um livro de arte. Ninguém sabe até hoje o que tem dentro desse quarto, nem você, nem sua mãe, nem o seu psiquiatra. Enquanto o dragão fica lá convicto de que você morre de medo dele, você continua convencido de que só não entra ali pra não ter o trabalho de matar o coitado.

No banheiro, antigo e grande, tem uma banheira que já foi oceano de bonecos, uma cortina de plástico, alguns decalques (meio tortos) descascados nos azulejos, um bidê muito importante e uma mania de comer pasta de dente escondido dos outros.

Um biscoito, que você mordia cuidadosamente pelas bordas para preservar intacta a figura que tinha dentro (era uma árvore, parece), está guardado na cozinha do coração junto com o cheiro do feijão da sua avó e a esperança de que estivessem fritando batatas.

O quintal está interditado. É campo minado. É um perigo. Deve ser atávico. Ninguém precisa ter tido um quintal na vida pra saber a alegria e a tristeza que podem causar uma cerca, um portão, uma pedra, uma lagarta. Nunca visite o quintal do seu coração, não corra esse risco, não cometa essa loucura, a não ser em caso de extrema necessidade ou em dias de vento forte, raios, relâmpagos e muitas trovoadas. Se você por acaso der de cara com você lá, brincando, bem contente, a sua vida pode virar uma calamidade.

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Restos do Carnaval - Clarice Lispector

          Não, não deste último carnaval. Mas não sei por que este me transportou para a minha infância e para as quartas-feiras de cinzas nas ruas mortas onde esvoaçavam despojos de serpentina e confete. Uma ou outra beata com um véu cobrindo a cabeça ia à igreja, atravessando a rua tão extremamente vazia que se segue ao carnaval. Até que viesse o outro ano. E quando a festa já ia se aproximando, como explicar a agitação que me tomava? Como se enfim o mundo se abrisse de botão que era em grande rosa escarlate. Como se as ruas e praças do Recife enfim explicassem para que tinham sido feitas. Como se vozes humanas enfim cantassem a capacidade de prazer que era secreta em mim. Carnaval era meu, meu.

No entanto, na realidade, eu dele pouco participava. Nunca tinha ido a um baile infantil, nunca me haviam fantasiado. Em compensação deixavam-me ficar até umas 11 horas da noite à porta do pé de escada do sobrado onde morávamos, olhando ávida os outros se divertirem. Duas coisas preciosas eu ganhava então e economizava-as com avareza para durarem os três dias: um lança-perfume e um saco de confete. Ah, está se tornando difícil escrever. Porque sinto como ficarei de coração escuro ao constatar que, mesmo me agregando tão pouco à alegria, eu era de tal modo sedenta que um quase nada já me tornava uma menina feliz.

E as máscaras? Eu tinha medo, mas era um medo vital e necessário porque vinha de encontro à minha mais profunda suspeita de que o rosto humano também fosse uma espécie de máscara. À porta do meu pé de escada, se um mascarado falava comigo, eu de súbito entrava no contato indispensável com o meu mundo interior, que não era feito só de duendes e príncipes encantados, mas de pessoas com o seu mistério. Até meu susto com os mascarados, pois, era essencial para mim.

Não me fantasiavam: no meio das preocupações com minha mãe doente, ninguém em casa tinha cabeça para carnaval de criança. Mas eu pedia a uma de minhas irmãs para enrolar aqueles meus cabelos lisos que me causavam tanto desgosto e tinha então a vaidade de possuir cabelos frisados pelo menos durante três dias por ano. Nesses três dias, ainda, minha irmã acedia ao meu sonho intenso de ser uma moça - eu mal podia esperar pela saída de uma infância vulnerável - e pintava minha boca de batom bem forte, passando também ruge nas minhas faces. Então eu me sentia bonita e feminina, eu escapava da meninice.

Mas houve um carnaval diferente dos outros. Tão milagroso que eu não conseguia acreditar que tanto me fosse dado, eu, que já aprendera a pedir pouco. É que a mãe de uma amiga minha resolvera fantasiar a filha e o nome da fantasia era no figurino Rosa. Para isso comprara folhas e folhas de papel crepom cor-de-rosa, com os quais, suponho, pretendia imitar as pétalas de uma flor. Boquiaberta, eu assistia pouco a pouco à fantasia tomando forma e se criando. Embora de pétalas o papel crepom nem de longe lembrasse, eu pensava seriamente que era uma das fantasias mais belas que jamais vira.

Foi quando aconteceu, por simples acaso, o inesperado: sobrou papel crepom, e muito. E a mãe de minha amiga - talvez atendendo a meu mudo apelo, ao meu mudo desespero de inveja, ou talvez por pura bondade, já que sobrara papel - resolveu fazer para mim também uma fantasia de rosa com o que restara de material. Naquele carnaval, pois, pela primeira vez na vida eu teria o que sempre quisera: ia ser outra que não eu mesma.

Até os preparativos já me deixavam tonta de felicidade. Nunca me sentira tão ocupada: minuciosamente, minha amiga e eu calculávamos tudo, embaixo da fantasia usaríamos combinação, pois se chovesse e a fantasia se derretesse pelo menos estaríamos de algum modo vestidas - àidéia de uma chuva que de repente nos deixasse, nos nossos pudores femininos de oito anos, de combinação na rua, morríamos previamente de vergonha - mas ah! Deus nos ajudaria! não choveria! Quando ao fato de minha fantasia só existir por causa das sobras de outra, engoli com alguma dor meu orgulho que sempre fora feroz, e aceitei humilde o que o destino me dava de esmola.

Mas por que exatamente aquele carnaval, o único de fantasia, teve que ser tão melancólico? De manhã cedo no domingo eu já estava de cabelos enrolados para que até de tarde o frisado pegasse bem. Mas os minutos não passavam, de tanta ansiedade. Enfim, enfim! Chegaram três horas da tarde: com cuidado para não rasgar o papel, eu me vesti de rosa.

Muitas coisas que me aconteceram tão piores que estas, eu já perdoei. No entanto essa não posso sequer entender agora: o jogo de dados de um destino é irracional? É impiedoso. Quando eu estava vestida de papel crepom todo armado, ainda com os cabelos enrolados e ainda sem batom e ruge - minha mãe de súbito piorou muito de saúde, um alvoroço repentino se criou em casa e mandaram-me comprar depressa um remédio na farmácia. Fui correndo vestida de rosa - mas o rosto ainda nu não tinha a máscara de moça que cobriria minha tão exposta vida infantil - fui correndo, correndo, perplexa, atônita, entre serpentinas, confetes e gritos de carnaval. A alegria dos outros me espantava.

Quando horas depois a atmosfera em casa acalmou-se, minha irmã me penteou e pintou-me. Mas alguma coisa tinha morrido em mim. E, como nas histórias que eu havia lido, sobre fadas que encantavam e desencantavam pessoas, eu fora desencantada; não era mais uma rosa, era de novo uma simples menina. Desci até a rua e ali de pé eu não era uma flor, era um palhaço pensativo de lábios encarnados. Na minha fome de sentir êxtase, às vezes começava a ficar alegre mas com remorso lembrava-me do estado grave de minha mãe e de novo eu morria.


Só horas depois é que veio a salvação. E se depressa agarrei-me a ela é porque tanto precisava me salvar. Um menino de uns 12 anos, o que para mim significava um rapaz, esse menino muito bonito parou diante de mim e, numa mistura de carinho, grossura, brincadeira e sensualidade, cobriu meus cabelos já lisos de confete: por um instante ficamos nos defrontando, sorrindo, sem falar. E eu então, mulherzinha de 8 anos, considerei pelo resto da noite que enfim alguém me havia reconhecido: eu era, sim, uma rosa.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Venha ver o pôr-do-sol - Lygia Fagundes Telles





Ela subiu sem pressa a tortuosa ladeira. À medida que avançava, as casas iam rareando, modestas casas espalhadas sem simetria e ilhadas em terrenos baldios. No meio da rua sem calçamento, coberta aqui e ali por um mato rasteiro, algumas crianças brincavam de roda. A débil cantiga infantil era a única nota viva na quietude da tarde.
Ele a esperava encostado a uma árvore. Esguio e magro, metido num largo blusão azul-marinho, cabelos crescidos e desalinhados, tinham um jeito jovial de estudante.
- Minha querida Raquel.

Ela encarou-o, séria. E olhou para os próprios sapatos.
- Vejam que lama. Só mesmo você inventaria um encontro num lugar destes. Que idéia, Ricardo, que ideia  Tive que descer do taxi lá longe, jamais ele chegaria aqui em cima.
Ele sorriu entre malicioso e ingênuo.

- Jamais, não é? Pensei que viesse vestida esportivamente e agora me aparece nessa elegância...Quando você andava comigo, usava uns sapatões de sete-léguas, lembra?
- Foi para falar sobre isso que você me fez subir até aqui? - perguntou ela, guardando as luvas na bolsa. Tirou um cigarro. - Hem?!
- Ah, Raquel... - e ele tomou-a pelo braço rindo. - Você está uma coisa de linda. E fuma agora uns cigarrinhos pilantras, azul e dourado... Juro que eu tinha que ver uma vez toda essa beleza, sentir esse perfume. Então fiz mal? 
- Podia ter escolhido um outro lugar, não? – Abrandara a voz – E que é isso aí? Um cemitério? Ele voltou-se para o velho muro arruinado. Indicou com o olhar o portão de ferro, carcomido pela ferrugem.
- Cemitério abandonado, meu anjo. Vivos e mortos, desertaram todos. Nem os fantasmas sobraram, olha aí como as criancinhas brincam sem medo – acrescentou, lançando um olhar às crianças rodando na sua ciranda. Ela tragou lentamente. Soprou a fumaça na cara do companheiro. Sorriu. - Ricardo e suas idéias. E agora? Qual é o programa?
Brandamente ele a tomou pela cintura.
- Conheço bem tudo isso, minha gente está enterrada aí. Vamos entrar um instante e te mostrarei o pôr do sol mais lindo do mundo.
Perplexa, ela encarou-o um instante. E vergou a cabeça para trás numa risada.
- Ver o pôr do sol!... Ah, meu Deus... Fabuloso, fabuloso!... Me implora um último encontro, me atormenta dias seguidos, me faz vir de longe para esta buraqueira, só mais uma vez, só mais uma! E para quê? Para ver o pôr do sol num cemitério...
Ele riu também, afetando encabulamento como um menino pilhado em falta.
- Raquel minha querida, não faça assim comigo. Você sabe que eu gostaria era de te levar ao meu apartamento, mas fiquei mais pobre ainda, como se isso fosse possível. Moro agora numa pensão horrenda, a dona é uma Medusa que vive espiando pelo buraco da fechadura...
- E você acha que eu iria?
- Não se zangue, sei que não iria, você está sendo fidelíssima. Então pensei, se pudéssemos conversar um instante numa rua afastada... - disse ele, aproximando-se mais. Acariciou-lhe o braço com as pontas dos dedos. Ficou sério. E aos poucos, inúmeras rugazinhas foram se formando em redor dos seus olhos ligeiramente apertados. Os leques de rugas se aprofundaram numa expressão astuta. Não era nesse instante tão jovem como aparentava. Mas logo sorriu e a rede de rugas desapareceu sem deixar vestígio. Voltou-lhe novamente o ar inexperiente e meio desatento –Você fez bem em vir.
- Quer dizer que o programa... E não podíamos tomar alguma coisa num bar?
- Estou sem dinheiro, meu anjo, vê se entende.
- Mas eu pago.
- Com o dinheiro dele? Prefiro beber formicida. Escolhi este passeio porque é de graça e muito decente, não pode haver passeio mais decente, não concorda comigo? Até romântico.
Ela olhou em redor. Puxou o braço que ele apertava.
- Foi um risco enorme Ricardo. Ele é ciumentíssimo. Está farto de saber que tive meus casos. Se nos pilha juntos, então sim, quero ver se alguma das suas fabulosas idéias vai me consertar a vida.
- Mas me lembrei deste lugar justamente porque não quero que você se arrisque, meu anjo. Não tem lugar mais discreto do que um cemitério abandonado, veja, completamente abandonado – prosseguiu ele, abrindo o portão. Os velhos gonzos gemeram. – Jamais seu amigo ou um amigo do seu amigo saberá que estivemos aqui.
- É um risco enorme, já disse . Não insista nessas brincadeiras, por favor. E se vem um enterro? Não suporto enterros.
- Mas enterro de quem? Raquel, Raquel, quantas vezes preciso repetir a mesma coisa?! Há séculos ninguém mais é enterrado aqui, acho que nem os ossos sobraram, que bobagem. Vem comigo, pode me dar o braço, não tenha medo...
O mato rasteiro dominava tudo. E, não satisfeito de ter se alastrado furioso pelos canteiros, subira pelas sepulturas, infiltrando-se ávido pelos rachões dos mármores, invadira alamedas de pedregulhos esverdinhados, como se quisesse com a sua violenta força de vida cobrir para sempre os últimos vestígios da morte. Foram andando vagarosamente pela longa alameda banhada de sol. Os passos de ambos ressoavam sonoros como uma estranha música feita do som das folhas secas trituradas sobre os pedregulhos. Amuada mas obediente, ela se deixava conduzir como uma criança. Às vezes mostrava certa curiosidade por uma ou outra sepultura com os pálidos medalhões de retratos esmaltados.
- É imenso, hem? E tão miserável, nunca vi um cemitério mais miserável, é deprimente – exclamou ela atirando a ponta do cigarro na direção de um anjinho de cabeça decepada.- Vamos embora, Ricardo, chega.
- Ah, Raquel, olha um pouco para esta tarde! Deprimente por quê? Não sei onde foi que eu li, a beleza não está nem na luz da manhã nem na sombra da tarde, está no crepúsculo, nesse meio-tom, nessa ambigüidade. Estou lhe dando um crepúsculo numa bandeja e você se queixa.- Não gosto de cemitério, já disse. E ainda mais cemitério pobre.
Delicadamente ele beijou-lhe a mão.
- Você prometeu dar um fim de tarde a este seu escravo.
- É, mas fiz mal. Pode ser muito engraçado, mas não quero me arriscar mais.
- Ele é tão rico assim?
- Riquíssimo. Vai me levar agora numa viagem fabulosa até o Oriente. Já ouviu falar no Oriente? Vamos até o Oriente, meu caro... Ele apanhou um pedregulho e fechou-o na mão. A pequenina rede de rugas voltou a se estender em redor dos seus olhos. A fisionomia, tão aberta e lisa, repentinamente escureceu, envelhecida. Mas logo o sorriso reapareceu e as rugazinhas sumiram.- Eu também te levei um dia para passear de barco, lembra?
Recostando a cabeça no ombro do homem, ela retardou o passo.
- Sabe Ricardo, acho que você é mesmo tantã... Mas, apesar de tudo, tenho às vezes saudade daquele tempo. Que ano aquele! Palavra que, quando penso, não entendo até hoje como agüentei tanto, imagine um ano.
- É que você tinha lido A dama das Camélias, ficou assim toda frágil, toda sentimental. E agora? Que romance você está lendo agora. Hem?- Nenhum - respondeu ela, franzindo os lábios. Deteve-se para ler a inscrição de uma laje despedaçada: - A minha querida esposa, eternas saudades - leu em voz baixa. Fez um muxoxo.- Pois sim. Durou pouco essa eternidade.
Ele atirou o pedregulho num canteiro ressequido.
Mas é esse abandono na morte que faz o encanto disto. Não se encontra mais a menor intervenção dos vivos, a estúpida intervenção dos vivos. Veja- disse, apontando uma sepultura fendida, a erva daninha brotando insólita de dentro da fenda -, o musgo já cobriu o nome na pedra. Por cima do musgo, ainda virão as raízes, depois as folhas... Esta a morte perfeita, nem lembrança, nem saudade, nem o nome sequer. Nem isso.Ela aconchegou-se mais a ele. Bocejou.
- Está bem, mas agora vamos embora que já me diverti muito, faz tempo que não me divirto tanto, só mesmo um cara como você podia me fazer divertir assim – Deu-lhe um rápido beijo na face. - Chega Ricardo, quero ir embora.
- Mais alguns passos...
- Mas este cemitério não acaba mais, já andamos quilômetros! – Olhou para atrás. – Nunca andei tanto, Ricardo, vou ficar exausta.
- A boa vida te deixou preguiçosa. Que feio – lamentou ele, impelindo-a para frente. – Dobrando esta alameda, fica o jazigo da minha gente, é de lá que se vê o pôr do sol. – E, tomando-a pela cintura: - Sabe, Raquel, andei muitas vezes por aqui de mãos dadas com minha prima. Tínhamos então doze anos. Todos os domingos minha mãe vinha trazer flores e arrumar nossa capelinha onde já estava enterrado meu pai. Eu e minha priminha vínhamos com ela e ficávamos por aí, de mãos dadas, fazendo tantos planos. Agora as duas estão mortas.
- Sua prima também?
- Também. Morreu quando completou quinze anos. Não era propriamente bonita, mas tinha uns olhos... Eram assim verdes como os seus, parecidos com os seus. 
Extraordinário, Raquel, extraordinário como vocês duas... Penso agora que toda a beleza dela residia apenas nos olhos, assim meio oblíquos, como os seus. - Vocês se amaram?
- Ela me amou. Foi a única criatura que... - Fez um gesto. – Enfim não tem importância.
Raquel tirou-lhe o cigarro, tragou e depois devolveu-o 
- Eu gostei de você, Ricardo.
- E eu te amei. E te amo ainda. Percebe agora a diferença?
Um pássaro rompeu o cipreste e soltou um grito. Ela estremeceu.
- Esfriou, não? Vamos embora.
- Já chegamos, meu anjo. Aqui estão meus mortos.
Pararam diante de uma capelinha coberta de alto a baixo por uma trepadeira selvagem, que a envolvia num furioso abraço de cipós e folhas. A estreita porta rangeu quando ele a abriu de par em par. A luz invadiu um cubículo de paredes enegrecidas, cheias de estrias de antigas goteiras. No centro do cubículo, um altar meio desmantelado, coberto por uma toalha que adquirira a cor do tempo. Dois vasos de desbotada opalina ladeavam um tosco crucifixo de madeira. Entre os braços da cruz, uma aranha tecera dois triângulos de teias já rompidas, pendendo como farrapos de um manto que alguém colocara sobre os ombro do Cristo. Na parede lateral, à direita da porta, uma portinhola de ferro dando acesso para uma escada de pedra, descendo em caracol para a catacumba.
Ela entrou na ponta dos pés, evitando roçar mesmo de leve naqueles restos da capelinha.
 Que triste é isto, Ricardo. Nunca mais você esteve aqui? Ele tocou na face da imagem recoberta de poeira. Sorriu melancólico.
- Sei que você gostaria de encontrar tudo limpinho, flores nos vasos, velas, sinais da minha dedicação, certo?
- Mas já disse que o que eu mais amo neste cemitério é precisamente esse abandono, esta solidão. As pontes com o outro mundo foram cortadas e aqui a morte se isolou total. Absoluta.
Ela adiantou-se e espiou através das enferrujadas barras de ferro da portinhola. Na semi-obscuridade do subsolo, os gavetões se estendiam ao longo das quatro paredes que formavam um estreito retângulo cinzento.
- E lá embaixo? 
- Pois lá estão as gavetas. E, nas gavetas, minhas raízes. Pó, meu anjo, pó - murmurou ele. Abriu a portinhola e desceu a escada. Aproximou-se de uma gaveta no centro da parede, segurando firme na alça de bronze, como se fosse puxá-la. – A cômoda de pedra. Não é grandiosa? Detendo-se no topo da escada, ela inclinou-se mais para ver melhor.
- Todas estas gavetas estão cheias? - Cheias?...
- Sorriu. - Só as que tem o retrato e a inscrição, está vendo? Nesta está o retrato da minha mãe, aqui ficou minha mãe - prosseguiu ele, tocando com as pontas dos dedos num medalhão esmaltado, embutido no centro da gaveta.
Ela cruzou os braços. Falou baixinho, um ligeiro tremor na voz.
- Vamos, Ricardo, vamos.
- Você está com medo?
- Claro que não, estou é com frio. Suba e vamos embora, estou com frio!
Ele não respondeu. Adiantara-se até um dos gavetões na parede oposta e acendeu um fósforo. Inclinou-se para o medalhão frouxamente iluminado:
- A priminha Maria Emília. Lembro-me até do dia em que tirou esse retrato. Foi umas duas semanas antes de morrer... Prendeu os cabelos com uma fita azul e vejo-a se exibir, estou bonita? Estou bonita?... - Falava agora consigo mesmo, doce e gravemente. - Não, não é que fosse bonita, mas os olhos... Venha ver, Raquel, é impressionante como tinha olhos iguais aos seus.
Ela desceu a escada, encolhendo-se para não esbarrar em nada.
- Que frio que faz aqui. E que escuro, não estou enxergando...
Acendendo outro fósforo, ele ofereceu-o à companheira.
- Pegue, dá para ver muito bem... - Afastou-se para o lado. - Repare nos olhos.
- Mas estão tão desbotados, mal se vê que é uma moça... - Antes da chama se apagar, aproximou-a da inscrição feita na pedra. Leu em voz alta, lentamente.- Maria Emília, nascida em vinte de maio de mil oitocentos e falecida... - Deixou cair o palito e ficou um instante imóvel – Mas esta não podia ser sua namorada, morreu há mais de cem anos! Seu menti...
Um baque metálico decepou-lhe a palavra pelo meio. Olhou em redor. A peça estava deserta. Voltou o olhar para a escada. No topo, Ricardo a observava por detrás da portinhola fechada. Tinha seu sorriso meio inocente, meio malicioso.
- Isto nunca foi o jazigo da sua família, seu mentiroso? Brincadeira mais cretina! – exclamou ela, subindo rapidamente a escada. – Não tem graça nenhuma, ouviu?
Ele esperou que ela chegasse quase a tocar o trinco da portinhola de ferro. Então deu uma volta à chave, arrancou-a da fechadura e saltou para trás.
- Ricardo, abre isto imediatamente! Vamos, imediatamente! – ordenou, torcendo o trinco. - Detesto esse tipo de brincadeira, você sabe disso. Seu idiota! É no que dá seguir a cabeça de um idiota desses. Brincadeira mais estúpida!
- Uma réstia de sol vai entrar pela frincha da porta, tem uma frincha na porta. Depois, vai se afastando devagarinho, bem devagarinho. Você terá o pôr do sol mais belo do mundo.
Ela sacudia a portinhola.
- Ricardo, chega, já disse! Chega! Abre imediatamente, imediatamente!- Sacudiu a portinhola com mais força ainda, agarrou-se a ela, dependurando-se por entre as grades. Ficou ofegante, os olhos cheios de lágrimas. Ensaiou um sorriso. - Ouça, meu bem, foi engraçadíssimo, mas agora preciso ir mesmo, vamos, abra...
Ele já não sorria. Estava sério, os olhos diminuídos. Em redor deles, reapareceram as rugazinhas abertas em leque.
- Boa noite, Raquel.
 Lygia Fagundes Telles
- Chega, Ricardo! Você vai me pagar!... - gritou ela, estendendo os braços por entre as grades, tentando agarrá-lo.- Cretino! Me dá a chave desta porcaria, vamos! - exigiu, examinando a fechadura nova em folha. Examinou em seguida as grades cobertas por uma crosta de ferrugem. Imobilizou-se. Foi erguendo o olhar até a chave que ele balançava pela argola, como um pêndulo. Encarou-o, apertando contra a grade a face sem cor. Esbugalhou os olhos num espasmo e amoleceu o corpo. Foi escorregando.
- Não, não...
Voltado ainda para ela, ele chegara até a porta e abriu os braços. Foi puxando as duas folhas escancaradas.
- Boa noite, meu anjo.
Os lábios dela se pregavam um ao outro, como se entre eles houvesse cola. Os olhos rodavam pesadamente numa expressão embrutecida.

- Não...
Guardando a chave no bolso, ele retomou o caminho percorrido. No breve silêncio, o som dos pedregulhos se entrechocando úmidos sob seus sapatos. E, de repente, o grito medonho, inumano:
- NÃO!

Durante algum tempo ele ainda ouviu os gritos que se multiplicaram, semelhantes aos de um animal sendo estraçalhado. Depois, os uivos foram ficando mais remotos, abafados como se viessem das profundezas da terra. Assim que atingiu o portão do cemitério, ele lançou ao poente um olhar mortiço. Ficou atento. Nenhum ouvido humano escutaria agora qualquer chamado. Acendeu um cigarro e foi descendo a ladeira. Crianças ao longe brincavam de roda.