Eu costumava lidar muito bem com essa coisa toda de estar apaixonado, mesmo da primeira vez (me lembro como se fosse ontem), mesmo quando tudo era desconhecido. Havia em mim uma confiança ingênua, quase infantil, de que tudo ia funcionar perfeitamente, seguindo algum tipo de ordem superior, um engenho perfeito onde cedo ou tarde tudo daria certo.
Essa confiança se manifestava numa certeza muda de que meu objeto de afeição era um grande herói, talvez ele entraria voando pela minha janela, a qualquer momento, me resgatando de um perigo que nem eu mesmo sabia correr. Era como se cada palavra dita por ele fosse vinda do mais sábio dos homens, não importa quão idiota fosse, e olha que, analisando agora, o que mais saia dali era idiotice!
Na minha mente planejava cada palavra, rodava um script na minha cabeça, e na ausência dele, punha palavras em sua boca, ainda que estas nunca fossem ditas.
Na verdade, tudo isso era muito bom, tornava minha vida mais leve, de um jeito único. A sensação de liberdade e adrenalina proporcionada por pular de paraquedas, a sensação quase orgásmica de uma montanha-russa.
Mas após tantas decepções e recuperações com este e outros objetos de afeição, após tanta esperança, tudo isso se foi, e, contudo, continua aqui.
Apaixono-me, e retomo esses sentimentos. Ainda consigo enxergar um herói, onde outros não vêem, aquele que faz de tudo para salvar até mesmo roedorezinhos indefesos, e para muitos insignificante, ainda me pego pensando em nossas conversas sem importância como se fossem altas discussões filosóficas, ainda planejo as falas, minhas e suas, e de qualquer um que possa estar por perto também...
Mas não há confiança, não há certeza de nada. Só há o medo, de que tudo dê errado, de novas decepções, é como se as forças invisíveis que antes me davam suporte agora se voltassem contra mim, esperando a melhor oportunidade para me sabotar. E quase posso sentir a dor que virá, quase posso vê-la espreitando, sorrindo maliciosamente, bafejando ao meu redor... E em meio a tudo isso, ainda tenho esperança.